A importância dos data centers — e de sua regulamentação —
foi discutida em audiências no Senado
Especialistas ouvidos pelo Senado nas duas últimas semanas
alertaram para o fato de que a pesquisa e o desenvolvimento de inteligência
artificial (IA) consomem muita energia elétrica. Para eles, esse impasse
ambiental e tecnológico precisa do olhar atento do Congresso Nacional.
Atualmente, o Brasil tem pelo menos 160 centros especializados em processamento
de dados, os chamados data centers, a maior parte deles na Região Sudeste
(110).
Basicamente, o data center é o local que guarda os sistemas
de computação de uma empresa, com recursos de armazenamento, de processamento e
de rede. Esses centros podem envolver computação, telecomunicação,
armazenamento de dados, pesquisa e desenvolvimento em informática, entre outras
áreas — mas todos consomem energia elétrica e precisam de fornecimento estável
e barato.
Os especialistas ouvidos pela Comissão de Ciência e
Tecnologia do Senado (CCT) acreditam que a regulamentação de data centers vai
contribuir para o desenvolvimento da economia e o avanço da inteligência
artificial em todos os setores. O Brasil tem potencial energético para ocupar
lugar de destaque no cenário mundial, garante vários deles.
É nesse contexto que se insere o PL 3.018/2024, projeto
de lei do senador Styvenson Valentim (PSDB-RN) que estabelece normas para o
funcionamento de data centers de IA, com ênfase em temas como eficiência
energética, sustentabilidade ambiental e responsabilidade no uso da tecnologia.
A proposta considera a rápida expansão do setor e os desafios que acompanham
esse avanço, como o consumo elevado de energia elétrica, a segurança
cibernética e a proteção de dados dos usuários.
O presidente da Associação das Empresas de Tecnologia da
Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom), Affonso Parga
Nina, disse que os data centers são peça fundamental do setor de tecnologia da
informação e comunicação. Ele informou que a cadeia econômica dos data centers
envolve engenharia especializada, empresas de desenvolvimento de software, de
cibersegurança e de soluções, entre outras.
— Essa visão ampla dos data centers é importante: se a gente
não tiver essa estrutura aqui no Brasil, a gente não consegue sustentar toda
essa cadeia, que gera empregos qualificados em quantidade bastante grande para
o Brasil. Hoje, nós temos mais de 2 milhões de pessoas empregadas no setor e no
macrossetor em funções de tecnologia da informação. E a demanda é muito maior.
São empregos, hoje, com média salarial duas vezes e meia, três vezes maior do
que a média salarial nacional. São empregos de alto valor agregado, empregos
que podem efetivamente ajudar na inclusão social — defendeu Parga Nina.
Eficiência
O presidente da Associação Brasileira de Data Centers, Renan
Lima Alves, afirmou que a melhora na eficiência ambiental não é mais um
diferencial, mas uma exigência para a competitividade no setor. Data centers
sem preocupação energética tendem a gastar mais e serem menos eficientes — e
acabam não aguentando a competição.
Representando a Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel), Cristiana Camaratti lembrou que a matriz energética brasileira tem
energias sustentáveis, como eólica e solar. Ela concordou com o senador
Vanderlan Cardoso (PSD-GO) sobre a importância de o Brasil aproveitar o momento
para atrair mais investimentos externos para, por exemplo, criar data
centers de IA sustentáveis.
Vanderlan (que é o relator do PL 3.018/2024, de Styvenson
Valentim) informou que o governo federal está atento à regulamentação e
disposto a discutir incentivos fiscais ao setor, como a isenção de tributos
sobre importação.
— Buscamos, com essas audiências, reunir o máximo de
informações, dados e estudos para que o relatório sobre esse projeto esteja
alinhado ao tema e abarque as demandas do setor, da academia e do governo —
salientou Vanderlan.
A presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica,
Elbia Gannoum, ressaltou que muitas empresas do setor tecnológico já usam a
energia eólica. Ela frisou que a eólica pode ser a energia mais competitiva do
mundo. Segundo Gannoum, para cada R$ 1 investido em energia eólica no Brasil,
aumenta-se R$ 3 de PIB.
— O Brasil é o país que pode prover a energia renovável mais
abundante e mais competitiva do mundo para fazer os data centers. (...) No caso
da energia eólica, nós tivemos a capacidade, junto com as políticas públicas
que foram feitas de nacionalização, de nacionalizar 80% da produção de um
aerogerador. Então, quando vem essa falsa ideia de que data center não gera
emprego, isso é um grande equívoco, porque nós temos de ter uma visão de cadeia
de produção, uma visão industrial — argumentou ela.
Ciência
O senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP) declarou que o
tema é de grande importância no mundo e favorece o Brasil, que precisa de
desenvolvimento por meio da ciência e da tecnologia, “que é a forma mais sólida
de crescer”.
— Existem três pernas conectadas, que são a segurança
cibernética, a inteligência artificial e a proteção de dados. Essas três pernas
precisam sempre andar juntas para que a gente tenha esse crescimento de forma
correta. O Brasil tem condições muito especiais e favoráveis para o
desenvolvimento de data centers aqui — defendeu Pontes.
O coordenador-geral de Inovação Digital do Ministério da
Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Rubens Caetano, disse que o projeto está
em sintonia com a Lei de Informática no que se refere à agregação de valor da
produção nacional, ao incremento da produtividade setorial e à busca de
soberania tecnológica da economia nacional.
— A inteligência artificial está em processo de expansão e
tem previsão de crescimento nas suas próximas gerações. Hoje a gente está
falando de inteligência artificial generativa. Ainda tem os próximos saltos
dela, uma inteligência artificial geral e, mais para a frente ainda, uma
superinteligência artificial. Isso já está alcançando e vai alcançar ainda mais
os diversos setores da economia. Vai impactar significativamente esses setores,
a forma como eles atuam. A produtividade desses setores vai ser afetada pela
inteligência artificial — enfatizou Caetano.
Dados
A diretora do Departamento de Transformação Digital e
Inovação do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços
(MDIC), Cristiane Vianna Rauen, afirmou que 25% do PIB mundial são baseados em
dados e que metade das exportações globais são feitas com serviços digitais.
— A capacidade de processar, armazenar e tratar dentro de
data centers, e viabilizar todas as cadeias associadas a esses data centers, é
algo importante e imprescindível do ponto de vista da política industrial e da
política econômica de maneira mais geral — destacou a diretora.
Diretora da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD),
Miriam Wimmer explicou que a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) tem estreita
relação com a regulamentação de data centers de IA. Temas como segurança
jurídica e tratamento e armazenamento de dados digitais preocupam pessoas e
empresas.
— Daí a importância de que tenhamos um marco jurídico
estável, um arcabouço institucional bem calibrado, para que as regras estejam
claras, de modo a promover a segurança jurídica necessária à atração de
investimentos e à proteção dos direitos das pessoas cujos dados eventualmente
sejam tratados no âmbito desses data centers — resumiu Wimmer.
O presidente da Associação Brasileira de Data Centers (ABDC),
Renan Lima Alves, apontou para as oportunidades no mercado tecnológico que o
incentivo à criação e à manutenção de data centers pode trazer ao país. Ele
afirmou que há descentralização, com a combinação de data centers de pequeno,
médio e grande portes. Também ressaltou que as empresas de data centers
estrangeiras querem do Brasil disponibilidade energética, fonte de energia
renovável e alta eficiência elétrica.
— O acelerador desse mercado foi a pandemia de covid-19. Quem
não estava digitalizado com acesso remoto não conseguia trabalhar.
Imediatamente se migrou para a nuvem e isso estimulou demais os data centers.
Isso criou um banco de dados extremamente relevante. A gente precisa de mais
data centers na borda para cada vez melhorar a experiência do usuário. Se a
gente depender de data centers muito remotos, a experiência do usuário é muito
ruim. Esse mercado só vem para o Brasil em função de nossa energia renovável —
pontuou Alves.
Também participaram dos debates na Comissão de Ciência e
Tecnologia (CCT) — nos dias 21 de maio e 28 de maio — os senadores
Izalci Lucas (PL-DF) e Styvenson Valentim (PSDB-RN); o presidente da Associação
Brasileira das Empresas de Software (Abes), Andriei Gutierrez; o professor
associado da Universidade Federal de Goiás (UFG) Celso Camilo; o assessor
especial do Ministério da Fazenda Igor Marchesini Ferreira; e o CEO da Everest
Digital, Gleysson Klynger de Moura Araújo.